quinta-feira, 13 de outubro de 2011

Casa Arrumada

Carlos Drummond de Andrade (1902-1987)

Casa arrumada é assim:
Um lugar organizado, limpo, com espaço livre pra circulação e uma boa entrada de luz.
Mas casa, pra mim, tem que ser casa e não um centro cirúrgico, um cenário de novela.
Tem gente que gasta muito tempo limpando, esterilizando, ajeitando os móveis, afofando as almofadas...
Não, eu prefiro viver numa casa onde eu bato o olho e percebo logo: Aqui tem vida...
Casa com vida, pra mim, é aquela em que os livros saem das prateleiras e os enfeites brincam de trocar de lugar.
Casa com vida tem fogão gasto pelo uso, pelo abuso das refeições fartas, que chamam todo mundo pra mesa da cozinha.
Sofá sem mancha?
Tapete sem fio puxado?
Mesa sem marca de copo?
Tá na cara que é casa sem festa.
E se o piso não tem arranhão, é porque ali ninguém dança.
Casa com vida, pra mim, tem banheiro com vapor perfumado no meio da tarde.
Tem gaveta de entulho, daquelas que a gente guarda barbante,
passaporte e vela de aniversário, tudo junto...
Casa com vida é aquela em que a gente entra e se sente bem-vinda.
A que está sempre pronta pros amigos, filhos...
Netos, pros vizinhos...
E nos quartos, se possível, tem lençóis revirados por gente que brinca ou namora a qualquer hora do dia. Casa com vida é aquela que a gente arruma pra ficar com a cara da gente.

Arrume a sua casa todos os dias...
Mas arrume de um jeito que lhe sobre tempo pra viver nela...
E reconhecer nela o seu lugar.

terça-feira, 13 de setembro de 2011

Declaração sobre entrevista ao Jornal Integração Setembro 2011

Recentemente fui chamada pela equipe do Jornal Integração da Serra para dar uma entrevista e indicar fontes de pesquisa para uma reportagem sobre a Semana Farroupilha. Na ocasião, sem um gravador e em uma conversa informal discutimos assuntos sobre tradicionalismo, CTGs e Cultura Gaúcha.

Infelizmente, na edição ou talvez por pouco conhecimento sobre o assunto, a entrevista foi tirada de contexto e, já que não havia sido gravada, foram publicadas em meu nome palavras que eu não disse (ao menos no sentido em que estão escritas), modificando totalmente o sentido do que foi falado.

Não quero me indispor de forma alguma com a equipe do jornal, que inclusive são meus amigos, e tenho certeza que o que aconteceu não foi proposital. Mas me vejo na obrigação, com os meus clientes, com os tradicionalistas, artistas da cultura gaúcha e com as pessoas que me acompanham e ensinam desde o prendado regional, a publicar uma declaração.

A dúvida da equipe do Jornal era o fato de, na opinião deles, a Cultura Gaúcha e os seus eventos não serem valorizados. Então declarei que, em minha opinião, a Cultura Gaúcha está sendo valorizada, sim, em nossa cidade e região, e que o público dos eventos tradicionalistas e nativistas está crescendo.

Foi me perguntado, então, QUAL A DIFERENÇA ENTRE TRADICIONALISMO E NATIVISMO? E foi esse o contexto da declaração polêmica publicada em meu nome.
No caso, O TRADICIONALISMO NÃO SE ATÉM APENAS A CANTAR E DANÇAR. É necessário conhecer toda a História e Geografia do Rio Grande do Sul e do Brasil, Tradição, Cultura e Folclore do nosso Estado. O Movimento Tradicionalista Gaúcho é um movimento grande e bem organizado, que tem a sua legislação, suas teses, seus princípios.

O que estava em discussão era a diferença entre Nativismo e Tradicionalismo. O nativismo é um movimento poético e musical, que envolve o Gaúcho Rio-grandense e o Gaucho Castelhano. O tradicionalismo tem por objetivo cultuar e difundir a tradição e a cultura do Rio Grande do Sul. Nesse sentido é que foi dito que no tradicionalismo se canta e dança “músicas feitas”, porque A MAIORIA DOS FESTIVAIS SÃO PROMOVIDOS NO MEIO NATIVISTA E É LÁ QUE SE ACONTECE A CRIAÇÃO. Pela qualidade desses festivais é também, muito difícil passar algum trabalho e é necessário muito conhecimento e talento para participar, o que muitos colegas de nossa cidade, como o Pedro Jr., o Vinícius Nardi, o Luciano Salerno, a Caren Burtet, entre outros, tem alcançado, como autores e intérpretes, e isso pode ser mais valorizado.

O Movimento Tradicionalista, nesse sentido, é uma escola, pois é nos Rodeios, concursos de Prendas e Peões, ENART e CTGs que se aprende a cantar, declamar, dançar, escrever, compor...
Além disso, a maioria dos tradicionalistas ouve música nativista, mas nem todo nativista é tradicionalista, ou fala de tradição. Músicas como Vento Negro e Vira Virou são nativistas e não falam de tradição. MAS SÃO DA CULTURA GAÚCHA.

Para finalizar, se não houvesse CULTURA ARTÍSTICA, eu não seria declamadora, porque não existiria poesia gaúcha. Jamais falei isso. O Gaúcho é um ser artístico por natureza. Séculos de Guerra, invernos frios e poucas festas, tornaram o gaúcho um ser melancólico, mas também expansivo e hospitaleiro. Os participantes do Rodeio Regional acontecido no último final de semana e os artistas que estão apresentando Shows na Semana Farroupilha são prova disso.

E foi por amor a essa cultura que decidi ser Arquiteta e Urbanista de Patrimônio Histórico e Cultural. Para poder ajudar a preservar o meio em que a nossa cultura acontece.
Peço desculpas à equipe do Jornal se fui dura, mas precisava deixar claras as minhas opiniões, para que não fossem deturpadas as minhas idéias e tudo aquilo o qual defendo.

quarta-feira, 31 de agosto de 2011

Das Velhas Casas

Rodrigo Bauer / Chico Saratt

Nas casas velhas que o progresso ameaça
Restam os vultos de meus dias ternos
Meu rosto jovem dorme na vidraça
Nas noites vastas desses meus invernos

No poço fundo que guardei as sedes
Vi tardes mornas a pedir janelas
Fiquei aos poucos dentre as tais paredes
Por minha sombra que timbrou-se nelas

A solidão é que entristece as casas
Vai-se a mobília procurando o preço
Os homens partem como quem tem asas
E mesmo as cartas mudam de endereços

As altas portas a soprar os ventos
Nessas lembranças que a saudade abrasa
Fazem pensar em tantos sentimentos
Que são humanas essas velhas casas

sexta-feira, 15 de julho de 2011

Nossa Senhora dos Navegantes em seu dia de festa no passo de São Borja

"Nossa Senhora dos Navegantes em seu dia de festa no passo de São Borja"
Autor: Apparicio Silva Rillo
Declamador: Vinícius Nardi
Amadrinhador: Marcos Grando (viola)


Faz algum tempo que prometo colocar esse vídeo no blog, com a apresentação do Vini na final do ENART, quando ele foi vencedor na categoria declamador adulto. Antes de sua apresentação, ele fala em PAISAGEM CULTURAL, conceito sobre o qual vou escrever logo que puder, mas que é muito bem retratada nesse poema do Apparicio, e que foi muito bem representada na interpretação do Vini e do Marcos.
Vendo essa apresentação fiquei pensando "Que bom que o Apparicio registrou tão bem essa paisagem de São Borja", mas ao mesmo tempo, penso "que pena que aquilo que se perdeu no tempo é tão difícil de ser recuperado."

Já elogiei esses artistas diversas vezes, mas quero deixar o registro que essa interpretação deles enriquece o poema por demonstrar coisas que quem não viveu em São Borja naquela época tem dificuldade de imaginar, e que, através de muita pesquisa e interpretação excelente, o Vinícius conseguiu nos passar.

quarta-feira, 1 de junho de 2011

Poesia no fast-food

A poesia e a música nativista estão finalmente se projetando do campo, para dar sensibilidade à selva de concreto. Estive fazendo um lanche semana passada em uma famosa lanchonete em Bento Gonçalves, e tive a grata surpresa de, ao começar a comer, ouvir uma música do saudoso Noel Guarani, bastante singela e agradável. Ao me informar, soube que estavam ouvindo uma rádio da cidade, que nesse horário apresenta um programa de música nativista e tradicionalista.

Por sinal, o local nada tinha a ver com nossas terras do Sul, já que é uma franquia multinacional norte-americana. Permito-me divulgar, pois sua localização em uma importante via turística, em frente ao hotel mais importante da cidade, próximo à Casa das Artes, valoriza ainda mais a importância dessa atitude por parte dos donos e funcionários, que provavelmente não tiveram a intenção de divulgar propositalmente esse tipo específico de música.

Mas só o fato de não estarem tocando músicas comerciais norte-americanas, como é o caso da maioria desses empreendimentos, valorizando as rádios da nossa Terra, é louvável. Além disso, o espaço oferecido por essa lanchonete nada lembra as fast-foods tradicionais, antes um caffè italiano, incentivando a alimentação saudável.

A respeito da Rádio que estavam ouvindo, é uma das muitas emissoras dessa região que apresentam programas de música gaúcha no final da tarde. A inserção da música nativista, mais calma e melodiosa, permitiu que essa expressão musical conquistasse lugar no comércio e escritórios da região. Percebe-se já a algum tempo que esses empreendimentos já não mudam de frequência quando iniciam esses programas, pois já apreciam e se habituaram a ouvir esse tipo de música, ao menos nesse horário.

Bom para os artistas, bom para cultura riograndense, bom para quem gosta de qualidade musical. Muito bom para as próximas gerações, que se desenvolverão valorizando também as culturas do seu lugar.

quinta-feira, 19 de maio de 2011

A Casa

Autor: Ebert Emanuel
Do Livro: Esboços para Futuros Poemas

A casa
- como um ventre
nos acolhe
morada íntima
a casa é muito mais
que paredes e tijolos

a casa somos nós
e os outros que alojamos

a casa somos nós
nós a construímos
com nossos
devaneios
nós nos construímos. 



Casas no Roteiro "Caminhos de Pedra", em Bento Gonçalves/ RS

segunda-feira, 9 de maio de 2011

Como Matar Um Planeta - Yanto Laitano

Tive a honra de assistir na noite de Páscoa, no Ferrovia Cult, em Bento Gonçalves, o show do artista que veio a ganhar o prêmio Açorianos como melhor instrumentista. Ele, de fato, havia sido indicado em 6 categorias, e posso garantir que, pelo que vi aquela noite, ele mereceu as indicações e a premiação.
O álbum, que ele disponibiliza em seu próprio site, é merecedor pela qualidade de suas letras e melodias, mas também pela visão e pela ousadia.

Dentre as músicas (e poesias) desse álbum, destaco a música "Como Matar Um Planeta", inspirada por José Lutzemberger, sendo que o autor fez as trilhas dos filmes "O Legado Lutzenberger."  Documentário de Frank Coe e Otto Guerra, 2008 e Lutzenberger: For Ever Gaia. Documentário de Frank Coe e Otto Guerra, 2007.

Para quem pensa que isso não tem a ver com  Arquitetura, lembro da importância do meio ambiente para nós, humanos. Antigamente falar em "meio ambiente" dizia respeito apenas à natureza, à fauna e à flora. Hoje, temos plena consciência que também fazemos parte do ambiente, e que o nosso "meio ambiente", nosso habitat são as cidades, cada vez mais poluídas e insalubres.

Yanto consegue lidar com esse tema de uma forma lúdica e crítica ao mesmo tempo, atentando para o perigo de não sermos "sustentáveis", como diz a palavra da moda, e além disso, de conviver em harmonia com o nosso meio ambiente. Vi em um documentário sobre ecodesign uma vez, que o autor dizia que se a nossa vida fosse apenas sustentável, não a consideraríamos boa. Então por que ser apenas sustentável, dizia o autor.

A música subscrita provoca uma boa reflexão sobre o que estamos fazendo com o nosso planeta, e indica a possibilidade de melhorar a nossa situação.
O site do autor, onde é possível conhecer seu trabalho e suas músicas é http://www.yantolaitano.com.br/


Como Matar Um Planeta
Autor: Yanto Laitano - para José Lutzemberger

joga o cigarro no chão e reclama da poluição
solta a fumaça no ar e foda-se quem respirar
olha ai esse cara, igual a ele tem mais um zilhão

instala uma usina nuclear num paraíso a beira-mar
corta a floresta inteira e vende pros gringo a madeira
olha aí o nosso mundo, igual a ele não temos nenhum

Mas ainda tem uma minoria que pretende conviver em
harmonia com o mundo
e repensar nossa postura de criaturas que só sabem
sugar a natureza até se acabar

Lá-lá lá-lá-lá lá-lá-lá, joga no rio a sujeira
Lá-lá lá-lá-lá lá-lá-lá, e diz que poupar água é besteira
Olha não vai ter graça se a vida na terra,
se a vida já era, se a vida na terra acabar

sábado, 16 de abril de 2011

Réquiem a uma Cozinha de Pedra

Sou suspeita a escrever sobre esse poema, já que o declamei por muito tempo. Admiro muito os versos de Guilherme Collares e sua visão tão particular sobre a poesia.

Esse poema, porém é interessante especialmente por mostrar a importância que algumas coisas, às vezes antigas e esquecidas, abandonadas e deterioradas, continuam tendo para as pessoas que com elas conviveram. Não pela sua importância material e estética, mas pela sua importância sentimental. Por tudo o que se passou naquele lugar, às vezes, por algumas gerações, e que aos poucos, foi virando Cultura.

O vídeo no final é a minha interpretação, apresentada na Interregional do ENART, em Soledade, em 2010, muito bem acompanhada pelos amigos Leandro Ebert, no violão, e Pedro Lemos, no violino.


Réquiem a Uma Cozinha de Pedra
Autor: Guilherme Collares


Numa querência que tive,
de campo de sonho e vida...
Um antigo fortim de pedras
de uma cozinha campeira
me retornou pro meu eu,
adormecido em mim mesmo...

Me deserdo dos meus olhos
pelas tristezas que vejo
no pago que conheci...

...com saudades da criança
que mudou... mudei; mudastes...
... e por meus olhos, eu vi!

A cumeeira da cozinha
cansou de exercer seu fim...
...e por seus olhos, eu vi...
esta saudade daninha
que nasceu, na tardezinha,
quando as pedras - da cozinha,
retornaram pro seu meio.

O que um dia foi da terra,
para a terra há de voltar!
... neste eterno renovar
do tudo que em nós existe.
Não vão, as mágoas do triste,
a lei dos tempos mudar!

Protetora - no seu eu...
mescla de forte e de buena;
misteriosa, cheia, plena...
Com semblantes de passado.
Memoriais escriturados
em cicatrizes terrenas.

Foi quando me vi brotado
que tive do teu mais terno...
Mateava - de manhã cedo;
"tardecita"- sol de  inverno...
com a alma da cozinha
revivendo na fumaça
meus antigos ancestrais;
a ensinarem - lampeiros,
o seu mister - de campeiros
de sábios e de guerreiros,
aos que seguiram-se após...

No fogão - há muito só;
cansado da solidão
de não ter a companhia
dos seus velhos tauras-pais,
que matearam em teu seio...
restou - solito e tristonho,
o empredrado das brasas,
das muitas chamas de pátria,
de fogão e corações,
que aqueceram os teus dias...
"yerva amarga"e picumã...

... e foi graxa de costela,
foi tisnado de cambona,
muitas crias de cadela
que o teu calor "acunou".

Numa fresta centenária
que se abria na cumeeira
com frente de corruíras
ensinaram para os homens
os segredos de uma vida
de harmonia com seu meio.

Um banco velho marcado
- com marcas de muitos longes -
de estância, história e passado...
As velhas marcas que outrora
retoçavam nos setembros
pelos quartos das eguadas...
Que fizeram muitos rastros,
de léguas... léguas e léguas,
nas picanhas dos tambeiros...
pra sangrar nos matadouros,
na carniça das charqueadas.
... Essas marcas velhaqueavam
nos costados do banquito.

Foi o berço do meu sangue...
de bugre, de pêlo-duro,
de negro, de castelhano,
de mouro... do que sou hoje!
...um resumo ensimesmado
da mescla continentina,
que brotou na cisplatina
das sementes do passado.

Foi a marca de uma raça
que nasceu embrutecida,
e viveu na dura lida
das tropas e gadarias...
que dobrou as invernias
com poncho-pátria e "sombrero".
Foram estes o sinuelo
aos matreiros da cultura
que cultuam as memórias
e valores verdadeiros.

Eu vi...
... meus olhos viram...
coração negou-se a olhar!
... o fortim a retornar
ao seu meio original!;
a cozinha maternal
já não aquece os meus dias,
o tempo desmancha sonhos
num processo natural.

E o chão chamou para sempre
a cozinha - para si...
...e por meus olhos, eu vi...
coração nem enxergou!

Só a saudade me restou
neste réquiem à cozinha...
da querência... que era minha...
... no pago que conheci...


 

quarta-feira, 2 de março de 2011

Novas Velhas Arquiteturas

    O melhoramento da economia e os diversos acordos feitos recentemente com países europeus, tem aberto muita oportunidade de viajar ao exterior, por turismo ou profissionalmente, em busca de novas idéias para os negócios ou simplesmente pelo deslumbre das belas vistas e a elegância da vida européia.
    O que quem não conhece a Europa não sabe, na verdade, é que por trás do luxo que vemos na televisão, há uma grande simplicidade nos costumes e na vida de cada lugar. A valorização das comidas e festas tradicionais, da vida saudável e tranquila, sob o cenário de construções antigas em harmonia com as tecnologias da nossa época são o que faz a poesia das cidades européias, cada uma a seu modo.
  
  Podemos, então, seguir o seu exemplo, valorizando as nossas coisas, que além de serem parte de nossa cultura, também são produtos turísticos muito fortes, pois o turismo cultural é um dos mais importantes no mundo. Selecionei alguns exemplos de cenas urbanas e de arquiteturas, na Europa e no Brasil, que mostram que às vezes, pequenas coisas podem tornar o empreendimento atrativo.
    A maioria dos casos apresentados envolve edificações ou paisagens antigas, como forma de demonstrar que existe uma infinidade de possibilidade de dar um novo uso às "casas velhas" ou de inovar cidades antigas.
   
Começemos com cenas mais tradicionais e bucólicas. Quem viveu na Serra Gaúcha nos anos 1980 deve se lembrar dos jardins floridos em frente às casas, das cortinas de Crochê e de bares com toldos na entrada, com mesas em frente à porta. A maioria dessas coisas não são mais valorizadas por aqui, e, embora ainda existam, faz um tempo que são raros por aqui.

Restaurante em Sirmione - interior da cidade de Brescia, na Itália. Cristiane Bertoco, 2007.

Loja em Sirmione - interior da provincia de Brescia, na Itália. Cristiane Bertoco, 2007.

Mesas ao ar livre em Mantova, na Itália. Cristiane Bertoco, 2007

Interior de um wine bar tradicional em Veneza. Cristiane Bertoco, 2007

Falemos agora de outras possibilidades, mais "modernas", de relação com as edificações antigas na cidade. Digamos que não é porque uma cidade ou um edifício é antigo que tem que parecer velho. Existem diversas formas mais contemporâneas de novas edificações dialogarem com as antigas. Novamente, vamos buscar algumas referências na Itália, mas também no Brasil.
É como se fosse um jogo dos 7 erros: onde está o novo? onde está o antigo? Porque o novo é assim? É importante ressaltar que tanto entre esses exemplos quanto nos anteriores, os antigos são antigos mesmo. Não há cópias, ou como nós arquitetos chamamos, falsificações históricas. Os exemplos a seguir existem exatamente porque em algum momento, faltou o prédio original, ou foi necessário fazer uma ampliação.

Edifício residencial e comercial junto à edifícios históricos em Cremona, Itália. Cristiane Bertoco, 2008.


Novas edificações inseridas no Centro Histórico de Padova, Italia. Cristiane Bertoco, 2008.

Biblioteca de Nembro (BG), Itália - Fonte: http://www.archinfo.it/  Fotos: Piero Savorelli 

Cantina Manincor - Itália. Nota-se que a parte nova está à esquerda da edificação antiga, abaixo dos parreirais. Fonte: Il Sole 24 ORE - Arketipo, Anno 2, n. 18. pag.74 a 83. Foto: Archiv Bildraum e Studio di Ingegneria Bergmeiste

Museu do Pão e Moinho Colonhese, Ilópolis, Rio Grande do Sul. Brasil Arquitetura. Essa obra, idealizada pelo arquitetos Marcelo Ferraz e Francisco Fanucci , acabou por criar um novo roteiro turístico, o "Caminho dos Moinhos".
Fonte: Revista AU. A Celebração da Madeira. Revista AU, 168. Pini: Março 2008. Foto: Nelson Kon




sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

Novo álbum Lorenzo Jovanotti & Racionalidade x Irracionalidade do Trabalho Criativo

Encontrei um vídeo com a entrevista sobre o novo album do artista italiano Lorenzo Jovanotti Cherubini. Entre as coisas muito interessantes que ele fala, uma me chamou muita atenção, e acredito que deve ser isso mesmo:

"O impulso é sempre emotivo e intuitivo. O inicial. Depois sim, há muito trabalho, de avaliação, essas coisas, porém sempre tudo nasce de um impulso irracional. Até mesmo para mim. É feito uns 99 % de racionalidade, mas esses 99% não valem absolutamente nada se não tem aquele 1% de irracionalidade, che governa tudo. Que torna bonita a canção, a torna mágica, a torna cativante." (Jovanotti).
Acredito que seja mesmo isso, na declamação, na poesia, na música, na arte e também na arquitetura e em outras formas de trabalho. O que seria de nós se não houvesse aquele 1% de magia que nos faz levantar todo dia da cama e trabalhar, defender um trabalho, uma idéia?
Na arquitetura esse 1% é aquilo que torna o espaço bonito, o edifício interessante, o sonho do cliente realizado... E é aquilo que nos faz ter prazer em nossa profissão, pois o resto do trabalho é o trabalho braçal de desenhar o projeto, escrever um memorial, elaborar um orçamento ou correr atrás de financiamentos e registros na prefeitura, CREA, órgãos ambientais, etc.
Também o de fiscalizar uma obra e muitas vezes (acredite!!!) de mostrar ao pedreiro como queremos que seja executada alguma coisa que ele não entendeu (com as nossas próprias mãos). Tive uma professora que uma vez botou a mão na massa (e nos tijolos!), para mostrar à sua mão de obra como queria que fosse executada uma parede de tijolos a vista.

Segue o vídeo. Para quem não o conhece, vale a dica de um trabalho bastante diferente e atual. Além disso, ele gosta muito do Brasil, passa algum tempo aqui, e gravou musicas como "Fango" no parque de Foz do Iguaçu e o album "Safari" no Rio de Janeiro.
Em suas músicas, ele fala muito sobre as cidades e a relação do elemento humano nelas, além de relacionar seus temas com situações atuais. Como ele diz na entrevista, a ele "emociona aquilo que nasce", belezas naturais, coisas do presente e do futuro.
Eu diria que é uma música quase filosófica, antropomórfica.


terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

Não apenas casas velhas...

Muitas vezes, quando visito uma cidade, uma colônia ou fazenda antiga, e chamo atenção para a beleza sua paisagem e de suas edificações, vem em resposta um comentário de desprezo: "Ah! Essa casa velha, caindo aos pedaços! Daqui a dois meses vou demolir pra fazer uma garagem." ou "aqueles morros que tinha ali eu aplainei pra construir um aviário. As árvores eu cortei e usei a madeira. Aquele "esgoto" (riacho) eu canalizei porque tinha mau cheiro. Não servia de nada, era feio."

Muitas pessoas, por falta de instrução ou de informação tendem a valorizar apenas aquilo que é novo ou que vem de fora. Eu pergunto: Por que valorizar as construções do Vaticano, as pequenas cidades da Itália os inúmeros patrimônios arquitetônicos da Europa? Por que valorizar pedras lascadas por humanóides de milênios atrás ou pirâmides construídas para enterrar ou assassinar pessoas? Por que valorizar paisagens antigas com ruínas de antigas civilizações? Será que esses monumentos tem valor apenas pela sua antiguidade ou pelos materiais preciosos com que foram construídos?

Eles tem valor, na verdade, pela importância que tiveram para seu próprio povo, que os conservou, algumas vezes, por milênios, para que estrangeiros que não valorizam essas "velharias" um dia viessem depredá-los.
Se na Europa e em muitos outros lugares que conservam suas tradições, os monumentos continuam existindo, é porque o seu próprio povo o valorizou e o protegeu. O que teria acontecido caso eles tivessem se comportado como a nossa sociedade? Se tivessem destruído as pirâmides ou as ruínas romanas?

"Andiamo vedere il bucco" - Pantheon, em Roma
Cristiane Bertoco, 2007
Toma-se o exemplo de uma das maiores construções romanas, hoje, uma das maravilhas do mundo - o Coliseu. Surgiu como um anfiteatro onde havia lutas de gladiadores e se jogavam prisioneiros para serem comidos pelos leões. Era o maior equipamento de lazer de Roma. Após a sua decadência, durante a Idade Média, foi usado como fonte de matéria prima para as novas construções. Mas o edifício era tão grande e tão imponente que mesmo com a destruição de parte de sua estrutura está ainda lá, para nos lembrar dos feitos de heróis, das injustiças religiosas e da miséria da idade média.
Coliseu, uma das maravilhas do mundo, na Itália
Cristiane Bertoco, 2007

Imagine agora se destruirmos todos os nossos casarios, as nossas paisagens, os nossos monumentos. Seremos vistos como um povo sem história e sem tecnologia. Ou talvez até imaginem que nossa terra não era povoada por uma civilização inteligente, dada a falta de registros históricos. 
Cantina Strapazzon, parreirais e "meda", em Bento Gonçalves
Cristiane Bertoco, 2008

Preservemos então as nossas "casas velhas", as estrebarias, os parreirais característicos de nossa região, que contam a história de nossas famílias, de nosso povo que tanto sofreu para que tivéssemos hoje trabalho e conforto nas cidades que eles fundaram. Se preservarmos a história que nós mesmos fizemos, manteremos nossa identidade e e um dia, talvez, seremos estudados como parte da história da humanidade.

segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

Construção _ Apparicio Silva Rillo

Pesquisando alguns poemas do saudoso Apparicio Silva Rillo, encontrei, no site de uma imobiliária de São Borja, o poema abaixo, muito interessante por sinal.

 "Construção".
                                         À Gerson Vigna
Dizer-se
que a casa esta pronta
      então habitá-la
é como acreditar que a eternidade
se resuma no exíguo de uma sala.
É uma antiga verdade
que  mais vale o andar
        que o haver chegado.
Nunca se deve, pois,
terminar uma casa,
cerrar-lhe as portas
       e morrer-se nela.
Toda a mágica esta
em saber construí-la
como se faz com a Vida:
 um tijolo de sonho,
o cravo de uma pena
        a cada dia.
                                        APPARICIO SILVA RILLO.